Penso que bastará não mais procurarmos o princípio e o fim de alheava, Já nem esse lugar pertence ao artista que o possa ter iniciado, a obra nunca pertence, na verdade, ela já nunca domina o homem, nem o tempo, nasce e logo se dá ao descontrole do ser. Alheava é assim, nasceu nessa terrível tarefa de desenhar o tempo, um tempo.
— Infinito processo cíclico, viagens de retomas a futuros incessantes.
1999, as imagens pelas palavras, o artista Manuel Santos Maia, a ficção do conto, as imagens formadas pelas palavras do outro, a ideia de um lugar, a ideia de um lugar e de um outro. 2014, a viagem e a retoma, Moçambique. Incessantemente voltar, quem escreveu a história, quem nos fala, porque fala, de que ela nos fala.
Precisamos apagar as imagens, reescrever sentidos, lermos e conhecermos o outro a fundo, penso, talvez não.
Quem escreve sobre os lugares, sobre o passado e o agora, África, Europa, América, Ásia, oceanos e mares as florestas.
Que são os filósofos e os geólogos e os mecânicos e os seres do espaço, quem são todos os que nos falam do outro.
Como vivemos com os objetos, dialogamos com a história de forma ampla, partimos sempre de uma terra já pisada, de uma história já infligida, sabidos que esse passado, talvez identitário, esse outro somos nós, aquele que se senta à nossa mesa, somos nós, somos e seremos a terra já pisada, salvando-nos a vontade de que até que os corpos debaixo do chão tenham nome, até que a história retome na sua natureza cíclica e bífida, possamos chegar a um lugar sem país no mundo, não para partimos do zero mas para olharmos com menos certezas de onde partimos.
Estas são as terríveis palavras para entrarmos na terrível tarefa de desenhar o tempo.
Tenham dúvidas e medos, mentiras e anseios, o que vemos é esse desenho do tempo e da memória. Quem desenharia a memória a lápis.
O desenho é este, são as malgas de terracota, são o cheiro, o toque a cor e o sabor dos grãos esfarelados e da terra, são o cozido, o cosido, o bordado no tecido, são as pedras com cor somadas no colar, na fita. Como imaginariam desenhar um lugar a lápis? É este o desenho falível de uma nova memória, de um lugar alheado para podermos estar dentro do tempo por algumas horas.
João Terras